terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Homilia da Festa da Epifania (Domingo 3 de Janeiro)

LEITURA I Is 60, 1-6

«Brilha sobre ti a glória do Senhor»

Leitura do Livro de Isaías
Levanta-te e resplandece, Jerusalém,
porque chegou a tua luz
e brilha sobre ti a glória do Senhor.
Vê como a noite cobre a terra
e a escuridão os povos.
Mas sobre ti levanta-Se o Senhor,
e a sua glória te ilumina.
As nações caminharão à tua luz,
e os reis ao esplendor da tua aurora.Olha ao redor e vê:
todos se reúnem e vêm ao teu encontro;os teus filhos vão chegar de longe,
e as tuas filhas são trazidas nos braços.Quando o vires ficarás radiante,
palpitará e dilatar-se-á o teu coração,
pois a ti afluirão os tesouros do mar,a ti virão ter as riquezas das nações.
Invadir-te-á uma multidão de camelos,
de dromedários de Madiã e Efá.
Virão todos os de Sabá,
trazendo ouro e incenso
e proclamando as glórias do Senhor.
Palavra do Senhor.
 
LEITURA II Ef 3, 2-3a.5-6

Os gentios recebem a mesma herança prometida

Irmãos:
Certamente já ouvistes falar
da graça que Deus me confiou a vosso favor:
por uma revelação,
foi-me dado a conhecer o mistério de Cristo.
Nas gerações passadas,
ele não foi dado a conhecer aos filhos dos homens,
como agora foi revelado pelo Espírito Santoaos seus santos apóstolos e profetas:
Os gentios recebem a mesma herança que os judeus,
pertencem ao mesmo corpo
e participam da mesma promessa,
em Cristo Jesus, por meio do Evangelho.

Palavra do Senhor.
 
 
EVANGELHO Mt 2, 1-12

«Viemos do Oriente adorar o Rei»

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
Tinha Jesus nascido em Belém da Judeia,
nos dias do rei Herodes,
quando chegaram a Jerusalém uns Magos vindos do Oriente.
«Onde está - perguntaram eles -
o rei dos Judeus que acaba de nascer?
Nós vimos a sua estrela no Oriente
e viemos adorá-l’O».
Ao ouvir tal notícia, o rei Herodes ficou perturbado
e, com ele, toda a cidade de Jerusalém.
Reuniu todos os príncipes dos sacerdotes e escribas do povo
e perguntou-lhes onde devia nascer o Messias.
Eles responderam:
«Em Belém da Judeia,
porque assim está escrito pelo Profeta:
‘Tu, Belém, terra de Judá,
não és de modo nenhum a menor
entre as principais cidades de Judá,
pois de ti sairá um chefe,
que será o Pastor de Israel, meu povo’».
Então Herodes mandou chamar secretamente os Magos
e pediu-lhes informações precisas
sobre o tempo em que lhes tinha aparecido a estrela.
Depois enviou-os a Belém e disse-lhes:
«Ide informar-vos cuidadosamente acerca do Menino;
e, quando O encontrardes, avisai-me,
para que também eu vá adorá-l’O».
Ouvido o rei, puseram-se a caminho.
E eis que a estrela que tinham visto no Oriente
seguia à sua frente
e parou sobre o lugar onde estava o Menino.
Ao ver a estrela, sentiram grande alegria.
Entraram na casa,
viram o Menino com Maria, sua Mãe,
e, prostrando-se diante d’Ele, adoraram-n’O.
Depois, abrindo os seus tesouros, ofereceram-Lhe presentes:
ouro, incenso e mirra.
E, avisados em sonhos
para não voltarem à presença de Herodes,
regressaram à sua terra por outro caminho.

Palavra da salvação.
 
Homilia do Pe Antoine Coelho, LC
 

 [Adoração dos Magos: Fra Angélico; 1445 (painel, 1,373m de diâmetro)]

Não podemos deixar de nos surpreendermos com a Epifania do Senhor, ou seja, a manifestação do Filho de Deus encarnado a todos os povos, simbolizada pela visita dos três Reis Magos vindos do oriente. Por que motivo, o evento mais glorioso da história da humanidade, a Encarnação de Deus, é presenciado por tão poucas pessoas? Tal é talvez a pergunta que nos vem imediatamente à mente. Fora dos confins estreitíssimos da gruta de Belém, encontram-se multidões inumeráveis famintas de Deus. Porque será que este acontecimento lhes passou desapercebido?
 
Certamente, ninguém pode pretender dar uma resposta cabal a estas perguntas. Os motivos profundos pertencem ao Mistério de Deus e ao mistério do homem, que unicamente Deus conhece. O que é certo é que o amor de Deus é discreto, não quer sacudir ninguém, não deseja violentar liberdades. Deus é como o pai bondoso da parábola do filho pródigo, que, diante do filho desejando afastar-se de casa, prefere ceder, sem no entanto baixar os braços e acreditando que a força e autenticidade do seu amor serão suficientes para que o filho volte a casa.


A humilde discrição de Deus leva-o a aparecer ao mundo, na noite do Natal, sem brilhos, sem gritos, sem encantos especiais. Que contraste com o mistério do mal, que necessita fazer de espantalho, que precisa fingir possuir força e plenitude, lançando constantemente os seus slogans arrogantes pelos meios de comunicação. Só os humildes ou os que se querem tornar humildes podem penetrar na simples gruta de Belém: Nossa Senhora, S. José, os pastores e, como o vemos no Evangelho de hoje, os Reis Magos.

Nos Reis Magos impressiona o facto de que não eram nem sequer judeus, ou seja, pertenciam a povos imersos no politeísmo, na adoração das forças da natureza, dos astros, dos animais, dos heróis passados, etc. Como chegaram à conclusão que existia um só Deus e que este Deus tinha de aparecer no mundo? Deus revela-se e encaminha misteriosamente homens humildes de todas as nações, não para que fiquem onde estão, com as suas crenças, mas para que venham ao encontro desse Deus que não temeu entrar no nosso tempo conturbado, para revelar as riquezas do seu amor. 

Os Reis Magos, além disso, eram homens sábios, dedicados ao estudo, mas que não faziam do estudo dos astros e da natureza o fim de sua vida. Buscavam Deus. A ciência nunca deve afastar de Deus, antes pelo contrário. E se, hoje em dia, o faz de múltiplas formas, como o são as inaceitáveis investigações sobre embriões humanos, é porque no coração de certos cientistas alojou uma secreta adoração à ciência. Tornou-se, para alguns, uma espécie de divindade cruel em cujos altares devemos inclusive sacrificar seres humanos. Não era isso o que acontecia no passado com a adoração dos falsos deuses? A Bíblia fala daqueles que sacrificavam os próprios filhos a Baal e a outras figuras divinas fictícias. Quando adoramos algo que não é Deus, esse algo termina sempre por escravizar-nos, e às vezes da forma mais impiedosa.

Mas, pelo contrário, quem pode pensar seriamente que esta criancinha, diante da qual se ajoelham os Reis Magos, é um tirano que veio para abusar da nossa liberdade? Está totalmente à mercê de sua mãe e do primeiro que vem, assim como hoje em dia, nos sacrários, sob a forma eucarística, está totalmente à nossa mercê. Quem poderá ter medo deste Deus? Fazê-lo, equivale a rechaçar o amor e a humildade na sua mais pura expressão, equivale a expulsá-los das nossas vidas. Por isso, o Senhor é verdadeiramente Aquele que revela os pensamentos secretos dos corações. A forma como reagimos diante d’Ele, que é amor sem mancha, nos mostra se o nosso amor era real e profundo, ou se consistia num conjunto de sentimentos superficiais.


Os Reis magos fizeram um longo caminho para chegar até ao Senhor, um caminho cheio de perigos e cansativo. Não terão ficado desiludidos ao constatar que no fim do mesmo, apenas encontraram uma pobre criança, sem fausto, sem guardas, sem outro poder que o do amor que se entrega? Tudo é questão de fé. Talvez nós também estamos a dar a nossa vida pelo Evangelho e depois de muitos anos de esforço não vemos os resultados previstos. Mas que resultados esperávamos? Esperávamos brilhar, se não diante dos homens, ao menos diante de nós mesmos? Recordemos sempre, como dizíamos ao início, que Deus se fez uma criança indefesa sem admiradores, nesta noite de Natal, e no meio de uma humanidade que o ignorava completamente. Mas esta semente, aparecida na calada da noite, transformou o mundo e transformará o nosso coração. Podia imaginar Abraão que seria pai de tantas nações, como Deus lhe prometera? Podiam imaginar os Reis Magos quantos homens de todos os povos e nações seguiriam o seu exemplo? Sim, podiam, mas com muita fé.

Que esta seja a nossa fé, irmãos e irmãs! Deus quer precisar dela, como precisou da de Maria, de José e dos Reis Magos. Quantas coisas não realizará Deus através dela, se perseverarmos até ao fim, sem pretendermos ter a satisfação de ver resultados imediatos. Deus não nos enganou no Evangelho: a fé move montanhas. Mas não nos prometeu que veríamos estas montanhas a serem movidas. Deixemos tudo isso, junto com a nossa vida, nas mãos de Deus, nas mãos dessa criancinha, para que ela nos guie suavemente.

Imagens extraídas dos sites: http://fra-angelico.blogspot.com/ e http://oracoesemilagresmedievais.blogspot.com/

Leituras extraídas do site do Secretariado Nacional de Liturgia.


domingo, 27 de dezembro de 2009

Homilia Domingo da Sagrada Família


LEITURA I Sir 3, 3-7.14-17a (gr. 2-6.12-14)

«Aquele que teme a Deus honra os seus pais»


Leitura do Livro de Ben-Sirá 
Deus quis honrar os pais nos filhos
e firmou sobre eles a autoridade da mãe.
Quem honra seu pai obtém o perdão dos pecados
e acumula um tesouro quem honra sua mãe.
Quem honra o pai encontrará alegria nos seus filhos
e será atendido na sua oração.
Quem honra seu pai terá longa vida,
e quem lhe obedece será o conforto de sua mãe.
Filho, ampara a velhice do teu pai
e não o desgostes durante a sua vida.
Se a sua mente enfraquece, sê indulgente para com ele
e não o desprezes, tu que estás no vigor da vida,
porque a tua caridade para com teu pai nunca será esquecida
e converter-se-á em desconto dos teus pecados.

Palavra do Senhor.

LEITURA II Col 3, 12-21
A vida doméstica no Senhor.

Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Colossenses
Irmãos:
Como eleitos de Deus, santos e predilectos,
revesti-vos de sentimentos de misericórdia,
de bondade, humildade, mansidão e paciência.
Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente,
se algum tiver razão de queixa contra outro.
Tal como o Senhor vos perdoou,
assim deveis fazer vós também.
Acima de tudo, revesti-vos da caridade,
que é o vínculo da perfeição.
Reine em vossos corações a paz de Cristo,
à qual fostes chamados para formar um só corpo.
E vivei em acção de graças.
Habite em vós com abundância a palavra de Cristo,
para vos instruirdes e aconselhardes uns aos outros
com toda a sabedoria;
e com salmos, hinos e cânticos inspirados,
cantai de todo o coração a Deus a vossa gratidão.
E tudo o que fizerdes, por palavras ou por obras,
seja tudo em nome do Senhor Jesus,
dando graças, por Ele, a Deus Pai.
Esposas, sede submissas aos vossos maridos,
como convém no Senhor.
Maridos, amai as vossas esposas
e não as trateis com aspereza.
Filhos, obedecei em tudo a vossos pais,
porque isto agrada ao Senhor.
Pais, não exaspereis os vossos filhos,
para que não caiam em desânimo.

Palavra do Senhor.


EVANGELHO Lc 2, 41-52


Jesus é encontrado por seus pais no meio dos doutores


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas



Os pais de Jesus iam todos os anos a Jerusalém,
pela festa da Páscoa.
Quando Ele fez doze anos,
subiram até lá, como era costume nessa festa.
Quando eles regressavam, passados os dias festivos,
o Menino Jesus ficou em Jerusalém,
sem que seus pais o soubessem.
Julgando que Ele vinha na caravana,
fizeram um dia de viagem
e começaram a procurá-l’O entre os parentes e conhecidos.
Não O encontrando,
voltaram a Jerusalém, à sua procura.
Passados três dias,
encontraram-n’O no templo,
sentado no meio dos doutores,
a ouvi-los e a fazer-lhes perguntas.
Todos aqueles que O ouviam
estavam surpreendidos com a sua inteligência e as suas respostas.
Quando viram Jesus, seus pais ficaram admirados;
e sua Mãe disse-Lhe:
«Filho, porque procedeste assim connosco?
Teu pai e eu andávamos aflitos à tua procura».
Jesus respondeu-lhes:
«Porque Me procuráveis?
Não sabíeis que Eu devia estar na casa de meu Pai?»
Mas eles não entenderam as palavras que Jesus lhes disse.
Jesus desceu então com eles para Nazaré
e era-lhes submisso.
Sua Mãe guardava todas estes acontecimentos em seu coração.
E Jesus ia crescendo em sabedoria, em estatura e em graça,
diante de Deus e dos homens.

Palavra da salvação.


Homilia do Pe Antoine Coelho, LC

O Domingo dentro da oitava do Natal é dedicado a celebrar a Sagrada Família. Trata-se de uma festa que não é de pouca importância, pois nos recorda algumas verdades fundamentais da nossa fé.

Cristo era Deus, mas também era um verdadeiro homem e, por isso, quis nascer e crescer no seio de uma família. Sobre João Baptista, informa-nos o Evangelho de Lucas que “crescia e o seu espírito se fortalecia. Viveu nos desertos até ao dia de sua manifestação a Israel”. Acerca do Senhor, porém, não se indica no Evangelho que, como criança e como jovem, ele buscasse especialmente os desertos ao ponto de viver neles. Quis estar intensamente unido ao seu Pai, mais intensamente que nenhum outro homem, mas sem deixar de viver entre os seus.

De facto, como mostra o Evangelho deste domingo, os pais ficaram totalmente surpreendidos quando, aos doze anos, não regressou com eles a Galileia, ficando na Cidade Santa. Chama a atenção que somente depois de um dia de viagem se deram conta de que não os acompanhava. É um indício de que não procurava especialmente a solidão. É na sua família, na Sagrada Família, onde ele encontrou o ambiente propício para a sua vida de união com Deus.

Efectivamente, depois de que a sua mãe o encontrou no templo, conta-nos Lucas que “Jesus desceu então com eles para Nazaré e era-lhes submisso” Além disso, “ia crescendo em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e dos homens”. Tudo voltava assim à normalidade. É muito importante sublinhar isso: Cristo quis ser “normal”, ensinando-nos que para ser santo não se necessita fazer coisas estranhas ou extravagantes.

Talvez por este motivo não quis dedicar-se especialmente aos jejuns e a uma vida de penitências. Certamente, passou, em determinada altura, 40 dias no deserto sem comer, ensinando-nos o valor do jejum, mas não quis fazer das penitências corporais o eixo da sua vida espiritual e do seu apostolado. Este eixo só podia ser a caridade e a obediência ao Pai. Cristo não veio para fazer “coisas” e dar “coisas” ao seu Pai e aos homens. Veio para dar o coração, o centro do seu ser.


Se Deus, como homem, quis uma família, isso mostra-nos o carácter sagrado da família. Desejando-a para si, consagrou definitivamente o seu valor. Com efeito, o homem, tal como Deus o pensou, não vive isolado. Vive em comunhão, vive inserido numa comunidade. Claro está que a comunidade pode adquirir fisionomias diversas segundo as situações. Inclusive, vivemos inseridos em várias comunidades ao mesmo tempo: a família, a paróquia, o movimento, a Igreja universal…O que é fundamental é que na sua relação com Deus, o homem não viva isolado. Não basta considerar-se ligado à Igreja universal, sem ter localmente um suporte comunitário. Dizem os franceses que “un chrétien isolé est un chrétien en danger”. Ou seja: um cristão isolado é um cristão em perigo.

Mas, porquê ser cristão é viver em comunidade? A resposta deve ir mais além das razões de conveniência. Não basta dizer que a comunidade é necessária porque nos oferece algum tipo de apoio espiritual, psicológico ou emocional. Existe uma razão mais profunda que essa, algo enraizado na nossa natureza: é o facto de que fomos criados à imagem de Deus e que Deus mesmo é uma comunidade. É Pai, Filho e Espírito Santo. A Origem e Causa de todas as coisas não é um ser solitário. O nosso Deus não é o deus dos muçulmanos, eternamente sozinho e cuja intimidade é inacessível e não partilhada por ninguém. Por isso, estes não poderão nunca afirmar o que ensina São João Evangelista: Deus é amor. Não podem compreender como nós, cristãos, que a Origem de tudo e a Causa de tudo é somente o Amor. Vemos então despontar desde outra perspectiva complementaria a razão pela qual devemos viver inseridos numa comunidade: para amar e aprender a amar como Deus ama. Fomos feitos para o amor. Por isso, fomos feitos para a comunhão.

O outro dia, voltando a Roma, encontrei no avião uma pessoa que não gostava de ir a missa, embora se considerasse católica. Não apreciava certas atitudes das pessoas de sua paróquia. Preferia em vez disso, refugiar-se no quarto, abrir a Bíblia e rezar tranquila. É verdade que Cristo recomenda no Evangelho rezar sozinho. Mas afirma também que “quando dois ou três estiverem reunidos em Meu nome Eu estarei no meio deles”. As duas coisas são necessárias: rezar sozinho e rezar em grupo. A nossa oração, a nossa vida cristã ficará mutilada e terminará por ser individualista se não se realizar numa comunidade. O poder da intercessão adquire uma força incomparável quando vários se reúnem e se decidem a rezar com fervor. Há pouco tempo, também, pedi a vários amigos que rezassem por mim, diante do Santíssimo Sacramento que eu tinha acabado de expor. Senti realmente os efeitos desta intercessão. Possivelmente, em cinco minutos de oração, conseguiram mais graças que as que teria obtido com muito mais tempo de meditação pessoal. No entanto, seria um erro desprezar a oração pessoal: é indispensável para desenvolver uma relação mais íntima e profunda com o Senhor.

Claro que quando nos encontramos reunidos não sempre é fácil conviver com certas pessoas, mas nada é mais educativo para o amor. Perdoar, ser amável quando não nos apetece, conter pensamentos críticos, ir ao encontro de quem nos resulta antipático ou nos fez alguma maldade…Todos estes actos tão profundamente cristãos seriam impossíveis fora de uma comunidade. Tinha totalmente razão São João Berchmans, um religioso jesuíta belga, ao repetir que a sua máxima penitência era a vida comunitária. E isso, não porque lhe resultava especialmente desagradável, mas porque nela era obrigado a sair de si mesmo. Este era o seu sacrifício fundamental, sacrifício de amor e obediência pura, que o santificou e tornou em grande parte célebre.

Pelo que dissemos anteriormente, vemos que a solidez e a dignidade das famílias não dependem somente do facto de serem imagens da Stma Trindade ou de serem o lugar onde crescemos no amor. Nelas, vive Cristo, quando os que a compõem não estão unidos simplesmente por laços de sangue, mas quando estão reunidos em nome dEle. Por isso, nunca se insistirá suficientemente sobre as graças que recebe uma família quando os seus membros rezam juntos. Isso devia acontecer muito em Nazareth. Jesus devia amar ternamente estes momentos em que na recitação dos salmos hebraicos, podia misturar a sua voz infinita e mais profunda que os oceanos, com as puras vozes de Maria e de José. Se queremos que essa voz infinita de Cristo se misture às nossas pequenas preces, o caminho é o da reunião. Quanto mais for tecida de caridade viva, esta reunião, mais far-se-á presente Cristo. À luz desta verdade, entendamos igualmente quão grave foi a divisão do cristianismo em diversas igrejas (católicos, ortodoxos, anglicanos, protestantes…). Se o mundo se secularizou tanto, é em grande parte devido ao facto de que os corações dos que deviam rezar unidos estão ainda demasiado separados. Disso deriva que a nossa oração não possui toda a sua força transformadora.

Mas se Cristo amou a sua família e, com isso, consagrou todas as famílias, é bom recordar que não a absolutizou. As nossas famílias não são um fim em si mesmo. Só Deus é fim. Dá pena, às vezes, quando por um amor não correcto à própria família se impede um filho de seguir uma vocação sacerdotal ou religiosa. Cristo mostra isso claramente no Evangelho de hoje. Os seus pais ficam admirados ao encontrarem-no no templo. “Filho, porque procedeste assim connosco?”, pergunta Maria. Mas, “não sabiam que eu devia estar na casa do meu Pai?”, responde ele com um nova pergunta. Ele veio para fundar esta grande família dos filhos de Deus que é a Igreja, cujos membros são unidos entre si não por um sangue carnal, mas pelo Sangue do Filho de Deus crucificado, ou seja, pelo Amor infinito de Deus. As famílias começam a degradar-se quando perdem de vista que devem viver abertas à Igreja e nela a Deus. Por isso, é na Igreja que encontram a sua realização. Tudo o que viver fechado sobre si mesmo, definhará.

Recordo que quando trabalhava em Paris, faleceu nesta cidade um membro da minha Congregação religiosa, a Legião de Cristo. Os pais tinham vindo dos Estados Unidos para o funeral, pois queriam que fosse sepultado onde dera a vida pelo Senhor. Depois de que o enterramos, não poderei nunca esquecer o que nos comentou a mãe, o rosto dividido entre as lágrimas e um sorriso que a dor tornava mais luminoso: “vocês todos, os legionários, são agora os meus filhos”. Tive então de conter as lágrimas. Essa mulher fora capaz de olhar para além dos interesses restringidos da família, dera o filho generosamente à Legião e à Igreja e agora, consumado o sacrifício, tornava-se capaz de amar com uma força e uma amplitude novas.

Como não reconhecer aqui a experiência de Nossa Senhora? Nunca absolutizou a Sagrada Família. Educava o Filho para a salvação dos homens e não para si. Cristo recordou-lhe isto de diversas maneiras, entre as quais figura o ficar vários dias em Jerusalém, ocupando-se das coisas do Pai, como nos diz o Evangelho de hoje. Por isso, Maria será capaz de suportar a cruz e, generosa até ao fim, o coração trespassado pela dor, tornar-se-á a mãe de todos os crentes. “Mulher eis aqui o teu filho”, recorda-lhe o Senhor crucificado, indicando com “filho” não somente S. João, mas todos os discípulos de todos os tempos.

Quem é capaz de viver profundamente enraizado na comunidade local, sacrificando-se e crescendo com ela, deve ter sempre o coração a contemplar a missão que é para o mundo inteiro e para a Igreja universal. Deus não quer nem que estejamos desligados do lugar onde vivemos e das pessoas com quem convivemos, nem que restrinjamos o nosso horizonte ao pequeno mundo que nos rodeia. Assim, seremos capaz de viver o amor em todas as suas dimensões e consequências, um amor concreto e ao mesmo tempo amplo. É este o amor de Maria e, mais ainda, o de Cristo. Deram a sua vida num mundo palestino tão pequeno que parecia carecer de importância, mas sabiam que com isso mudariam para sempre a história dos homens.

As nossas famílias e comunidades parecem pequenas e sem grande transcendência, mas, nos tempos difíceis que correm, para não nos desanimarmos, nunca consideremos que o que fazemos vale pouco. Com efeito, se não tiverem medo de se abrirem ao plano de Deus, com elas é todo o mundo que muda. Um sorriso a quem pouco nos amou faz sorrir o mundo. Uma palavra de amor que transforma um coração, penetra no coração do mundo, porque toca o de Deus. É movido por esta fé que o amor cristão conquistou o mundo romano. Não será diversamente agora.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Leituras do Dia de Natal

LEITURA I Is 52, 7-10

«Todos os confins da terra verão a salvação do nosso Deus»

Leitura do Livro de Isaías
Como são belos sobre os montes
os pés do mensageiro que anuncia a paz,
que traz a boa nova, que proclama a salvação
e diz a Sião: «O teu Deus é Rei».
Eis o grito das tuas sentinelas que levantam a voz.
Todas juntas soltam brados de alegria,
porque vêem com os próprios olhos
o Senhor que volta para Sião.
Rompei todas em brados de alegria, ruínas de Jerusalém,
porque o Senhor consola o seu povo,
resgata Jerusalém.
O Senhor descobre o seu santo braço à vista de todas as nações
e todos os confins da terra verão a salvação do nosso Deus.

Palavra do Senhor.

SALMO RESPONSORIAL Salmo 97 (98), 1.2-3ab.3cd-4.5-6 (R. 3c)

Refrão: Todos os confins da terra

viram a salvação do nosso Deus.

Cantai ao Senhor um cântico novo
pelas maravilhas que Ele operou.
A sua mão e o seu santo braço
Lhe deram a vitória.

O Senhor deu a conhecer a salvação,
revelou aos olhos das nações a sua justiça.
Recordou-Se da sua bondade e fidelidade
em favor da casa de Israel.

Os confins da terra puderam ver
a salvação do nosso Deus.
Aclamai o Senhor, terra inteira,
exultai de alegria e cantai.


Cantai ao Senhor ao som da cítara,
ao som da cítara e da lira;
ao som da tuba e da trombeta,
aclamai o Senhor, nosso Rei.
 
LEITURA II Hebr 1, 1-6
 
«Deus falou-nos por seu Filho»
 
Leitura da Epístola aos Hebreus
Muitas vezes e de muitos modos
falou Deus antigamente aos nossos pais, pelos Profetas.
Nestes dias, que são os últimos,
falou-nos por seu Filho,
a quem fez herdeiro de todas as coisas
e pelo qual também criou o universo.
Sendo o Filho esplendor da sua glória
e imagem da sua substância,
tudo sustenta com a sua palavra poderosa.
Depois de ter realizado a purificação dos pecados,
sentou-Se à direita da Majestade no alto dos Céus
e ficou tanto acima dos Anjos
quanto mais sublime que o deles
é o nome que recebeu em herança.
A qual dos Anjos, com efeito, disse Deus alguma vez:
«Tu és meu Filho, Eu hoje Te gerei»?
E ainda: «Eu serei para Ele um Pai
e Ele será para Mim um Filho»?
E de novo,
quando introduziu no mundo o seu Primogénito, disse:
«Adorem-n’O todos os Anjos de Deus».
Palavra do Senhor.


EVANGELHO Jo 1, 1-18

«O Verbo fez-Se carne e habitou entre nós»

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João

No princípio era o Verbo
e o Verbo estava com Deus
e o Verbo era Deus.
No princípio, Ele estava com Deus.
Tudo se fez por meio d’Ele
e sem Ele nada foi feito.
N’Ele estava a vida
e a vida era a luz dos homens.
A luz brilha nas trevas
e as trevas não a receberam.
Apareceu um homem enviado por Deus, chamado João.
Veio como testemunha,
para dar testemunho da luz,
a fim de que todos acreditassem por meio dele.
Ele não era a luz,
mas veio para dar testemunho da luz.
O Verbo era a luz verdadeira,
que, vindo ao mundo, ilumina todo o homem.
Estava no mundo
e o mundo, que foi feito por Ele, não O conheceu.
Veio para o que era seu
e os seus não O receberam.
Mas, àqueles que O receberam e acreditaram no seu nome,
deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus.
Estes não nasceram do sangue,
nem da vontade da carne, nem da vontade do homem,
mas de Deus.
E o Verbo fez-Se carne e habitou entre nós.
Nós vimos a sua glória,
glória que Lhe vem do Pai como Filho Unigénito,
cheio de graça e de verdade.
João dá testemunho d’Ele, exclamando:
«Era deste que eu dizia:
‘O que vem depois de mim passou à minha frente,
porque existia antes de mim’».
Na verdade, foi da sua plenitude que todos nós recebemos
graça sobre graça.
Porque, se a Lei foi dada por meio de Moisés,
a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo.
A Deus, nunca ninguém O viu.
O Filho Unigénito, que está no seio do Pai,
é que O deu a conhecer.

Palavra da salvação.



quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Leituras da Noite de Natal

LEITURA I Is 62, 1-5

Leitura do Livro de Isaías Por amor de Sião não me calarei,

por amor de Jerusalém não terei repouso,
enquanto a sua justiça não despontar
como a aurora e a sua salvação
não resplandecer como facho ardente.
Os povos hão-de ver a tua justiça
e todos os reis da terra a tua glória.
Receberás um nome novo,
que a boca do Senhor designará.
Serás coroa esplendorosa nas mãos do Senhor,
diadema real nas mãos do teu Deus.
Não mais te chamarão «Abandonada»,
nem à tua terra «Deserta»; mas hão-de
chamar-te «Predilecta» e à tua terra «Desposada»,
porque serás a predilecta do Senhor e
a tua terra terá um esposo. Tal como
o jovem desposa uma virgem, o teu Construtor
te desposará; e como a esposa
é a alegria do marido, tu serás a alegria do teu Deus.
Palavra do Senhor.


SALMO RESPONSORIAL Salmo 88 (89), 4-5.16-17. 27 e 29 (R. 2a)

Refrão: Cantarei eternamente
as misericórdias do Senhor. (Repete-se)

Concluí uma aliança com o meu eleito,
fiz um juramento a David meu servo:
Conservarei a tua descendência para sempre,
estabelecerei o teu trono por todas as gerações.
 
Feliz o povo que sabe aclamar-Vos
e caminha, Senhor, à luz do vosso rosto.
Todos os dias aclama o vosso nome
e se gloria com a vossa justiça.
 
Ele me invocará: ‘Vós sois meu Pai,
meu Deus, meu Salvador’.
Assegurar-lhe-ei para sempre o meu favor,
a minha aliança com ele será irrevogável.
 
LEITURA II Actos 13, 16-17.22-25

Leitura dos Actos dos Apóstolos

Naqueles dias, Paulo chegou a
Antioquia da Pisídia.
Uma vez em que ele estava na sinagoga,
levantou-se, fez sinal com a mão
e disse: «Homens de Israel e vós
que temeis a Deus, escutai:
O Deus deste povo de Israel escolheu
os nossos pais e fez deles um grande povo,
quando viviam como estrangeiros
na terra do Egipto. Depois, com seu braço
poderoso, tirou-os de lá. Por fim, suscitou-lhes
David como rei, de quem deu este testemunho:
‘Encontrei David, filho de Jessé, homem
segundo o meu coração, que fará sempre
a minha vontade’. Da sua descendência,
como prometera, Deus fez nascer Jesus,
o Salvador de Israel. João tinha proclamado,
antes da sua vinda, um baptismo de penitência
a todo o povo de Israel. Prestes a terminar
a sua carreira, João dizia: ‘Eu não sou quem julgais;
mas depois de mim, vai chegar Alguém,
a quem eu não sou digno de desatar
as sandálias dos seus pés’».
Palavra do Senhor.


EVANGELHOForma longa Mt 1, 1-25

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus

Genealogia de Jesus Cristo, Filho de David,
Filho de Abraão: Abraão gerou Isaac;
Isaac gerou Jacob; Jacob gerou Judá e seus irmãos.
Judá gerou, de Tamar, Farés e Zara;
Farés gerou Esrom; Esrom gerou Arão;
Arão gerou Aminadab; Aminadab gerou Naasson;
Naasson gerou Salmon; Salmon gerou, de Raab, Booz;
Booz gerou, de Rute, Obed;
Obed gerou Jessé; Jessé gerou o rei David.
David, da mulher de Urias, gerou Salomão;
Salomão gerou Roboão; Roboão gerou Abias;
Abias gerou Asa; Asa gerou Josafat;
Josafat gerou Jorão; Jorão gerou Ozias;
Ozias gerou Joatão; Joatão gerou Acaz;
Acaz gerou Ezequias; Ezequias gerou Manassés;
Manassés gerou Amon; Amon gerou Josias;
Josias gerou Jeconias e seus irmãos,
ao tempo do desterro de Babilónia.
Depois do desterro de Babilónia,
Jeconias gerou Salatiel; Salatiel gerou Zorobabel;
Zorobabel gerou Abiud; Abiud gerou Eliacim;
Eliacim gerou Azor; Azor gerou Sadoc;
Sadoc gerou Aquim; Aquim gerou Eliud;
Eliud gerou Eleazar; Eleazar gerou Matã;
Matã gerou Jacob; Jacob gerou José,
esposo de Maria, da qual nasceu Jesus, chamado Cristo.
Assim, todas estas gerações são:
de Abraão a David, catorze gerações;
de David ao desterro de Babilónia, catorze gerações;
do desterro de Babilónia até Cristo, catorze gerações.
O nascimento de Jesus deu-se do seguinte modo:
Maria, sua Mãe, noiva de José,
antes de terem vivido em comum,
encontrara-se grávida por virtude do Espírito Santo.
Mas José, seu esposo, que era justo
e não queria difamá-la, resolveu repudiá-la em segredo.
Tinha ele assim pensado, quando lhe apareceu
num sonho o Anjo do Senhor, que lhe disse:
«José, filho de David, não temas receber Maria,
tua esposa, pois o que nela se gerou
é fruto do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho
e tu pôr-Lhe-ás o nome de Jesus, porque
Ele salvará o povo dos seus pecados».
Tudo isto aconteceu para se cumprir
o que o Senhor anunciara por meio do Profeta,
que diz: «A Virgem conceberá
e dará à luz um Filho, que será chamado ‘Emanuel’,
que quer dizer ‘Deus connosco’».
Quando despertou do sono,
José fez como o Anjo do Senhor lhe ordenara
e recebeu sua esposa.
 Palavra da salvação.

Assim nos fala o Deus Menino

"Nasci pobre, para que saibas que sou a única riqueza.
 Nasci num estábulo, para que saibas santificar qualquer ambiente ou situação.
 Nasci Menino, Eu o Senhor, para que não tenhas medo de Mim.
 Nasci durante a noite, para que saibas que posso iluminar qualquer realidade ou situação.
 Nasci como pessoa humana, para que nunca te envergonhes de ti.
 Nasci como homem, para que tu possas "deus".
 Nasci no meio de perseguições, para que saibas aceitar as dificuldades e sofrimentos:
 O SOFRIMENTO HUMANIZA DEUS E DIVINIZA O HOMEM".


Colectânea de Presépios

Os presépios são desde há muito, uma forma de expressar e a forma de viver o Natal Cristão com a criatividade de cada um, seja artista reconhecido, ou um artista particular que todos nós acabamos por ser.

Deixamo-vos alguns presépios para todos os gostos, dos mais variados artistas que fomos pesquisando pela Internet, inclusivé alguns para que possam ser pintados pelos mais pequenos após serem impressos.

Todos os artistas que os realizaram estão de parabéns, pois são todos fantásticos.

O desejo de um Santo Natal para todos vós.

A equipa de Homilias e Orações.







 





















































 








segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Estandarte de Natal - O Sucesso!



Temos oportunidade de verificar que muitas janelas de cidades e vilas portuguesas têm exposto este Estandarte de Natal com fundo vermelho e ao centro Jesus Cristo.

O sucesso, foi possível devido ao trabalho de um grupo de famílias cristãs, e pode ser adquirido nos respectivos locais de venda permanente.

Estão distribuidos cerca de 30.000 estandartes, e em muitos dos locais de venda, estão mesmo esgotados. Esperemos que para o próximo ano haja mais disponíveis para que na maioria das janelas se veja Cristo, na correria do nosso dia a dia pelas ruas das cidades, vilas e todas as localidades em geral.

Consultem a missão, locais de venda permanente, a mensagem do Pe. Hugo Santos (capelão da Universidade Católica Portuguesa) e outras informações desta iniciativa em: http://www.estandartesdenatal.org

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

IV Domingo Advento Ano C

LEITURA I Miq 5, 1-4a

«De ti sairá Aquele que há-de reinar sobre Israel»

Leitura da Profecia de Miqueias

Eis o que diz o Senhor:
«De ti, Belém-Efratá,
pequena entre as cidades de Judá,
de ti sairá aquele que há-de reinar sobre Israel.
As suas origens remontam aos tempos de outrora,
aos dias mais antigos.
Por isso Deus os abandonará
até à altura em que der à luz

aquela que há-de ser mãe.
Então voltará para os filhos de Israel
o resto dos seus irmãos.
Ele se levantará para apascentar o seu rebanho
pelo poder do Senhor,
pelo nome glorioso do Senhor, seu Deus.
Viver-se-á em segurança,
porque ele será exaltado até aos confins da terra.
Ele será a paz».
Palavra do Senhor


LEITURA II Hebr 10, 5-10

«Eu venho para fazer a vossa vontade»

Leitura da Epístola aos Hebreus

Irmãos:
Ao entrar no mundo, Cristo disse:
«Não quiseste sacrifício nem oblações,
mas formaste-Me um corpo.
Não Te agradaram holocaustos nem imolações pelo pecado.
Então Eu disse: ‘Eis-Me aqui;
no livro sagrado está escrito a meu respeito:
Eu venho, ó Deus, para fazer a tua vontade’».
Primeiro disse: «Não quiseste sacrifícios nem oblações,
não Te agradaram holocaustos nem imolações pelo pecado».
E no entanto, eles são oferecidos segundo a Lei.
Depois acrescenta: «Eis-Me aqui:
Eu venho para fazer a tua vontade».
Assim aboliu o primeiro culto
para estabelecer o segundo.
É em virtude dessa vontade
que nós fomos santificados
pela oblação do corpo de Jesus Cristo,
feita de uma vez para sempre.
Palavra do Senhor.


EVANGELHO Lc 1, 39-45

«Donde me é dado que venha ter comigo a Mãe do meu Senhor?»

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas

Naqueles dias,
Maria pôs-se a caminho
e dirigiu-se apressadamente para a montanha,
em direcção a uma cidade de Judá.
Entrou em casa de Zacarias e saudou Isabel.
Quando Isabel ouviu a saudação de Maria,
o menino exultou-lhe no seio.
Isabel ficou cheia do Espírito Santo
e exclamou em alta voz:
«Bendita és tu entre as mulheres
e bendito é o fruto do teu ventre.
Donde me é dado
que venha ter comigo a Mãe do meu Senhor?
Na verdade, logo que chegou aos meus ouvidos
a voz da tua saudação,
o menino exultou de alegria no meu seio.
Bem-aventurada aquela que acreditou
no cumprimento de tudo quanto lhe foi dito
da parte do Senhor».
Palavra da salvação.


Homilia do Pe Antoine Coelho, LC

É belo contemplar, no Evangelho deste 4º Domingo de Advento, com que velocidade Maria se dirige à casa de Zacarias para ajudar a prima Isabel. Antes deste episódio, o evangelista São Lucas acabava de relatar a Anunciação do anjo a Maria. Este, depois de lhe anunciar que será Mãe do Filho de Deus, dá-lhe a conhecer que Isabel, estéril, dará à luz, “porque nada é impossível para Deus”. Maria então responde ao Anjo que é a serva do Senhor e que tudo seja feito segundo a sua palavra.

São João Baptista, ainda no ventre da Mãe, já está a exercer, de alguma forma, o ofício de precursor, anunciando com a sua vinda milagrosa, uma vinda ainda mais maravilhosa. O facto de Isabel dar à luz, é sinal para Maria da veracidade do anjo. No entanto, Maria não espera visitar a prima e assegurar-se de que está realmente grávida. Ao contrário de Zacarias, pai de João, ela acredita sem antes ver sinais. Ela faz parte daqueles que Cristo, depois da Ressurreição, chamará bem-aventurados porque, sem ver, acreditaram.

O que significou acreditar para Maria? Dar uma parte do seu ser – o ventre – a Deus? É serva do Senhor porque dá um pedaço de si? Não. Mais que o seio, ofereceu a Deus o coração. A prova disso é que se apressou a ir ao encontro da prima, para ajudá-la nas necessidades. Por isso, crer para ela tampouco significa pôr à disposição uma parte de sua vida, a que mais lhe convém. Maria é Mãe do Salvador debaixo da cruz, longe das lisonjas e das honras, oferecendo o coração trespassado pela dor. Crer, para ela, mais que uma segurança na vida, é dar a vida, como Cristo na cruz. E, por isso, sente-se mais segura que ninguém. Sente que a sua vida, porque dada completamente a Deus, está totalmente nas suas Mãos.

Tudo isso torna-se ainda mais claro quando analisamos o que significava a resposta de Maria à luz da segunda leitura da carta aos Hebreus. Ela responde ao anjo: “Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra”. Qual é então a palavra do anjo? Digamos, em primeiro lugar, que não é simplesmente uma palavra do anjo. É sobretudo Palavra de Deus porque transmite uma mensagem de parte de Deus. Esta palavra anuncia que o Filho de Deus vai encarnar-se no seio de Maria. Por isso, Maria, nesta resposta ao anjo, diz, no fundo, isso: “que se realize a Encarnação em mim”. O que acontece durante a Encarnação, a carta aos Hebreus no-lo descreve desta forma: “Ao entrar no mundo, Cristo disse: «Não quiseste sacrifício nem oblações, mas formaste-Me um corpo. Não Te agradaram holocaustos nem imolações pelo pecado. Então Eu disse: ‘Eis-Me aqui; no livro sagrado está escrito a meu respeito: Eu venho, ó Deus, para fazer a tua vontade’».

Por isso, em Maria e também ao longo da sua vida, vai realizar-se precisamente o que Cristo aqui diz. Toda a sua vida vai ser, no fundo, um repetir constantemente esta palavra com o seu Filho: “Pai, não queres coisas de mim, não queres holocaustos, nem sacrifícios, não queres pedaços do meu tempo, pedaços da minha atenção, alguma parte do meu coração. Nada disso te agrada realmente. O que queres é toda a minha vida, porque tu, sendo Deus, não podes merecer menos”.

Tudo isso recorda-nos Abraão, chamado na Bíblia o pai dos crentes, e por isso modelo da fé. Com Abraão, vai começar uma nova aventura de Deus com os homens, a aventura da sua salvação. Qual é a primeira coisa que Yahve lhe diz? “Deixa a tua terra e vai para aquela que eu te mostrarei!” Quem encontra Deus, não pode já ficar na sua “terra”, ou seja, não pode continuar a existir centrado em si mesmo. O primeiro efeito do encontro com Deus é a liberação de nós mesmos. Maria também, apenas acolhe a Palavra de Deus com fé, é levada até outra terra, a da sua prima, é levada até aos outros, porque a “terra dos outros”, a terra do serviço, por assim dizer, é a única pátria do cristão.

É custoso, tudo isso! Pensemos também que Maria teve que deixar de novo a sua terra, grávida de oito ou nove meses, para dar à luz Cristo. Como foi dura esta viagem! Mas é a mesma simbologia. Queres dar Cristo ao mundo? Queres dar ao mundo a única coisa que vale a pena dar-lhe? Então, deves deixar a tua terra, deves deixar esta casa que é somente a tua para ir a Belém, que significa em hebreu “a casa do pão”. Ou seja: deves ir a este lugar do serviço onde Deus quer alimentar todos os homens, não com coisitas que não saciam a fome, mas conSigo mesmo. No entanto, Deus não o fará se tu não viajares, como Deus não teria feito de Israel o povo eleito, se Abraão, levado pela fé, não se tivesse lançado nesta aventura.

É custoso, tudo isso, com efeito, mas Maria ensina-nos como ultrapassar o medo e a tentação de uma vida mais fácil. Ela responde ao anjo: “faça-se em mim segundo a tua Palavra.” Se vemos que Deus nos pede algo difícil, se vemos que existe algo da moral da Igreja que nos custa, não devemos actuar como uma senhora que, certo dia, diante de um ensinamento, respondeu-me: “Padre, isso que nos pede não é aplicável hoje em dia, já o apaguei da memória!” Que pena. Certamente sentimo-nos muitas vezes sem forças para aquilo que Deus nos pede. Mas isso não é uma situação anómala. É até querida por Deus, penso eu, porque isso obriga-nos a recorrer a Ele com fé. Todos os santos sentiram-se fracos e impotentes, mas, como Maria, souberam dizer “faça-se em mim segundo a tua Palavra”.

Recordemos que a palavra de Deus é criadora. Basta ler o primeiro capítulo do livro do Génesis: “E Deus disse: ‘que a luz seja e a luz foi….’” Neste relato, cada Palavra de Deus vai produzindo uma parte do mundo a partir de nada. Quem acolhe a Palavra de Deus no coração, embora saiba que não tem forças para cumprir a Vontade do Senhor, pelo poder desta Palavra, transformará o seu coração e tornar-se-á pouco a pouco capaz de seguir os mandamentos.

Vejam o que nos conta o profeta Jeremias que tanto medo tinha de falar de Deus: “a palavra de Yahve foi para mim um opróbrio e uma burla quotidiana. E eu dizia: ‘não tornarei a recordá-lo, nem falarei já em seu nome. Mas havia no meu coração algo parecido a um fogo ardente, que me consumia os ossos, e ainda que me esforçasse por afogá-lo, não podia’”. O profeta expôs-se muitos anos à Palavra de Deus e esta, pouco a pouco, penetrou-lhe tão profundamente na alma que não a podia já abandonar. Tinha de a comunicar, embora soubesse que lhe ia causar muitos problemas.

Que não sejamos como Zacarias, o pai de João Baptista. A sua atitude diante do anjo que lhe anuncia o nascimento do seu filho é completamente oposta à de Maria. Diante desta notícia, pede um sinal. Não crê sem sinais. Primeiro, Deus tem de descer ao seu mundo. Então, ele poderá dar-se. Mas na verdade, ainda que Deus desça, não se dará realmente. Porque a sua atitude básica é a de submeter Deus a si, não poderá reconhecer um Deus que é tudo menos isso. Se Maria, junto com os Reis magos que abandonaram tudo, pode acreditar que este menino que nasce tão pobremente é Filho de Deus, é porque ela mesma experimentou vitalmente o valor da pobreza e da humildade. O orgulhoso não pode compreender o Deus humilde e, ainda que lhe apareça, duvidará da veracidade daquilo que tem diante dos olhos. O castigo que receberá Zacarias é o de não poder falar até que João nasça. Quem não aceita a Palavra de Deus no coração, não tem realmente nada para dizer aos outros, nada que lhes possa realmente transmitir. Porque, para isso, o homem foi criado: para dar Deus. Ele é a imagem, a janela através do qual se entra em contacto com a Altíssimo: esta é a essência da sua vocação.

Já, dentro de pouquíssimos dias festejaremos o Natal, a vinda da Segunda Pessoa da Sma. Trindade, a qual é também chamada a Palavra ou Verbo de Deus. Acolhemo-la com generosidade no coração. Sabemos que Ela é muito grande para o nosso pobre coração, tão limitado por muitos motivos. Mas o facto é que Ela quer vir ao nosso coração. E Ela tem todo o poder para criar nele o espaço necessário para aí morar. Para isso, como Maria, sejamos homens de fé. Talvez tudo isso pareça absurdo para os doutos deste mundo, recorda-nos São Paulo, mas a sabedoria de Deus é a verdadeira sabedoria, mesmo se é loucura para os que pensam saber muito.