Caros amigos, enviei esta resposta a um bom amigo sobre uma apresentação [clique para a ver] que me enviou. Achei que podia ajudar. Vale a pena vê a apresentação porque dá que pensar:
«Bonita apresentação. Conheço o Leonardo Boff. Foi franciscano. Casou e deixou o sacerdócio. Coisas que podem suceder e que não temos direito de julgar, como é óbvio. Tudo isso aconteceu sem que antes tivesse feito uma curiosa mistura entre fé e marxismo nos anos 70 e 80. Depois da caída do muro de Berlim, virou-se para o ecologismo e agora está ocupado com a ética global.
Daí esta ideia de fundo da apresentação, que ele não menciona directamente, mas que se pode deduzir: o verdadeiro culto é a compaixão, a bondade, a misericórdia, ser altruísta, a responsabilidade, etc. E certamente é verdade. Não existe verdadeiro culto sem isso. Como diz São Joao, não pode amar o Deus que não vê, quem não ama o seu irmão que vê.
Mas há outro aspecto o muito ligado a isso que ele deixa na sombra. Como faço para viver assim? As sombras, o mal, em mim, não é como um vestido de que me posso despir porque simplesmente o quero. A experiência pessoal e a história da humanidade ensinam que habita no coração do homem, no centro do seu ser. Por isso é tão difícil perdoar, por isso surgem os problemas de herdade e outros familiares, os problemas conjugais, problemas infinitos quando entre as pessoas está em jogo o dinheiro, por isso esta tendência tão forte a fazer de si mesmo o centro da vida, a preferir a fama, o sucesso ao bem do próximo, etc. Esse mal só Deus pode vencê-lo em mim, embora sempre com a minha colaboração, como é lógico.
Neste sentido, o que eu responderia ao Dalai Lama é que a religião verdadeira não é tanto aquela através da qual tu te aproximas de Deus, mas é aquela em que Deus se aproxima de ti e te salva. Sabemos que isso não existe nas religiões orientais. Nelas, é o homem que se salva e não Deus que o salva. Nelas, não existe Deus salvador. É verdade que acreditam nos assim chamados “avatares”. Mas não te salvam, realmente. Indicam o caminho que tu vais ter que percorrer. E no fundo, estás sozinho nisso. Podes ter gente a apoiar, a encorajar, a dar bom exemplo, mas só tu caminhas o teu próprio caminho.
Mas o homem não se pode salvar por si mesmo. Estou convencido disso. Vivo todos os dias nas estreitas paredes da minha própria limitação. Mas eu creio em Jesus, que em arameu quer dizer precisamente “Deus salva”, eu creio nesse Deus que sem qualquer interesse próprio se faz homem e dá a vida por mim numa cruz.
Porquê numa cruz? Porque o mal é tão sério que Deus não o quer apagar sem mais nem menos. Isso seria irresponsabilidade. Alguém tem de pagar o preço. Como o homem não o podia fazer, Deus mesmo fê-lo por ele. Com o exemplo desse Deus sinto-me realmente impelido a fazer, também eu, o bem, mesmo quando o preço é alto. Mas sobretudo (e isso é realmente decisivo) o que aconteceu é que esse Deus que se fez homem e morreu por mim na cruz, tomando sobre si o mal do mundo, uniu-se a todo homem. E, se eu O acolher, aceitando lutar por cumprir os seus mandamentos apesar de minha fraqueza e de todas as minhas numerosas caídas passadas, presentes e futuras, Ele então vive em mim. “Não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim”, diz São Paulo aos Gálatas. Ele ama em mim. Trabalha em mim. Sacrifica-se em mim. E então não sou eu que me torno bom, porque no fundo sou bom, sou forte, tenho muitos méritos e capacidades…Mas é Ele e eu numa espécie de matrimónio místico em que Ele está em mim e eu n’Ele...Ele e eu vamos caminhando em direção ao Pai. Não existe a solidão, não carregamos o peso de tudo nas nossas costas tão fracas. Ele carregou a cruz e eu, como Simão de Cirene, vou e ajudo-o a levar a cruz (a minha cruz!).
Essa é a nossa vida cristã. Isso é o que eu tenho experimentado cada dia nesses 16 anos de vida religiosa. Sinceramente não quero outra coisa….
Perdão, se prolonguei a resposta, mas acho importante entender o que nos caracteriza e porque uma ética global, mesmo se em si é um esforço que merece louvor…não basta. Podes enviar o que eu disse a quem quiseres, se vires que pode ter alguma utilidade.»
P. Antoine, LC
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